quarta-feira, 8 de julho de 2009

És toda Goa...


Juro-vos que não é preguiça e explico-vos porquê.
Já não escrevo para quem me leu ou para quem me lê agora, desde 7 de Maio.
Se, por um lado, me poderia sentir incomodado (porque já sabem, muitos vos estimo e não quero que passem sem mim), a verdade é que esta lacuna informativa acontece por ausência de novidades.

Quem já passou os olhos por alguns dos posts mais antigos deste impressionante espaço na web, imediatamente se aperceberá que as novidades se esgotam ao fim de poucos parágrafos.
Porque, efectivamente, não há nada de novo no deserto. Isto é mesmo assim.
Há é muito folclore mas a esse nível, estamos conversados.
Não quero que deixem de recomendar o DoandBuy aos vossos melhores amigos e, é por isso, que me sinto no direito de não o banalizar.
Como tudo na vida (e no futebol): a qualidade à quantidade.

Por outro lado, aconteceu Goa.
E porque Goa não acontece todos os dias (nem que nos sintamos da gama Vasco) necessitei de quase um mês para absorver, assimilar, desconstruir e resumir de tecla, a torrente sensacional de aquisições novas.
Quando nos apercebemos que os estágios são finitos como o petróleo, que não há férias para quem devia gostar muito de trabalhar para o seu país e que “se ia meter um 10 de Junho”, único feriado a gozar e ponte a construir, ninguém ficou com dúvidas quando propus as três letras de viagem.

É, de facto, a grande vantagem (consultar lista de vantagens) de residir aqui, qual hub para destinos nada acessíveis a europeus, mais agora que se começa a piscar o olho às low fare trips
Petra, Damasco ou a fascinante Mesopotâmia ficariam para outra altura.
Tinha que se ter coragem para escolher.
E fomos valentes. Bravos rapazes...


Mas como se explica Goa às pessoas?
Goa é muito mais bonito que o Dubai.
É com esta frase que quero começar.
E não é só “porque são realidades incomparáveis”... É porque é mesmo verdade.
O Dubai é árido, tórrido, artificial e megalómano. Goa é airosa, fresca, natural e simples.
Ah..e dizem vocês, “os gostos não se discutem”.
Pois confidencio-vos eu: eu acho que sim. Que se discutem.



Goa será um painel de azulejos ainda mais colorido do que aqueles belíssimos que encontramos nas nossas tão exclusivas estações e apeadeiros.
É uma respiração de Portugal mais lenta, envelhecida, carente e amorosa.
Goa é tão velhinha que dá vontade de a colocar numa cadeira de baloiço e aguardar que nos conte mais outra história.

Este foi o primeiro ex-território ultramarino (de todos os outros que ainda tenho para/por visitar) com quem privei...de quem senti o bafo.

E juro-vos que, apesar de poder dizer que conheço muito bem Portugal Continental, nunca tinha cheirado, visto e ouvido tanta coisa sobre o meu país.
Os esforçados e inexcedíveis professores de História com quem tive o privilégio de ter aprendido no passado, não me atestaram mais do que um guia de visita, conjunto de pistas teorizadas para a descoberta.

E é de parte desse transversal capítulo (para bem e para mal) da história colonial portuguesa que me vou deter nos próximos largos minutos de escrita.

O que mais impressiona em Goa é perceber Portugal vivido na Índia, pelas gentes de lá.
Porque Goa é Índia que leva consigo Portugal.
Um countryside (abomino a palavra “província”) português, exótico e colorido, de etnografia única e sentida.



Estar-se na Índia e sentir-se em Portugal é avassalador.
Percebemos que as partilhas culturais são compatíveis e desejáveis mesmo que explicadas por motivos menos consensuais ou até objectivamente errados.
A colonização existiu mas releva a partilha.

Há partilha em tudo.
Traços na arquitectura, nos rostos, nos apelidos, nas abordagens, na vivência social e religiosa, nos brandos costumes, na hospitalidade e na beleza.
Primeiro hindús, depois muçulmanos e, por último católicos. Sem impedimentos, ainda continuam a coabitar.


As misturas são deveras impressionantes e tudo pode acontecer. Calcorreio várias lojas em rua mal alcatroada à procura de uma t-shirt que assente na minha esquisitice. Olho para a esquerda e acredito ter visto os olhos verdes mais bonitos e a pele castanha mais irresistível de sempre. Entro e converso.
“A minha avó Maria era portuguesa mas a única palavra que me lembro de ouvir é patrão (silêncio…). "

As casas dos “patrões” são inacreditáveis, ao jeito das quintas (que mais parecem Sextas) das Beiras. Estes landlords viviam melhor que 95% dos portugueses de território metropolitano.
Seriam militares portugueses, garante da pouca necessidade de paz para a região e comerciantes. Suas esposas, domésticas e ¼ de seus filhos, ilegítimos.




Os Fernandes e Sousas (e, claro, os incontornáveis Smiths portugueses, os Silvas) são, pelo que nos pudemos aperceber pelos outdoors, placas profissionais e monumentos alusivos, as famílias que mais semearam.
E de facto, os rostos são portugueses, a pele mais escura, os olhos surpresa de cor.

“Boa tarde, são portugueses? Não queria deixar de vos dar os parabéns porque hoje é o vosso dia. O 10 de Junho.”
Replico: “…e o dia da Língua Portuguesa!”.
Não disfarço um arrepio e sorrio largamente”. Tinhamos acabado de ser abordados, num Português imaculado, pelo pároco goês da imponente catedral onde jaz o douto São Francisco Xavier. É um dos mais importantes locais de peregrinação de todo o mundo católico.

Estamos em Goa Velha.
Imaginem qualquer coisa como Belém sem pastéis, muito mais verde-castanha, quase por estimar e com os Jerónimos nada manuelinos com pedra alaranjada, divididos em grupos de imponentes igrejas.

Um magríssimo guia ofereceu-nos prestimosos serviços em troca de umas parcas 100 Rupias. De imediato, apercebendo-se da nossa capacidade para falar o Português, meio tremeliqueiro avança com um: “bom dia…eu mostro-vos a igreja do Santo.”
E assim foi, mais uma revisão da História de Portugal in loco, a milhares de kms de distância do epicentro. Desde a brutalidade da abordagem, às casas queimadas, à conversão mais ou menos pacífica das populações.
Mais outro arrepio.

Este é um dos poucos locais do globo em que Vasco da Gama é muito mais conhecido que o insular Cristiano Ronaldo.
E só por isso, já deve merecer todo o nosso respeito.

Não caiam no erro de ir a Goa sem alugar um veículo motorizado.
Motorizem-se de “acelera” por cerca de 6 euros negociáveis em 4 dias e podem, dessa forma, sem pressões de tráfego e horários esquecer a precariedade da rede de transportes públicos e aproveitar para ver os animais de pastorícia que lentamente, ao ritmo da região, vos acompanham em cima de pavimento que alterna entre o engravilhado e o mal alcatroado.
Aliás, em Goa tudo é bastante barato, o que simplifica ainda mais todo o processo.
Mas devia ser proibido ir a Goa só 4 dias…



Motorizados, descubram as praias todas, mergulhem, sequem pelo caminho, parem para fotografar e comer camarão-tigre ou as gambas a acompanhar com a inevitável Kingfisher (imaginem a Super Bock).

Com pouco tempo de preparação e um voo Dubai-Dabolim reservado em cima do joelho, pouco nos restou, se não ir à descoberta do nosso imaginário das aulas de História e buscar, se tivessemos algum tempo, o local exacto do nascimento de Narana Sinai Coissoró.

Fomos na época baixa, já ameaçados pela época de monção (podia fazer a piada fácil com um dos Concelhos da raia minhota), o que por um lado foi bom, porque visitamos com silêncio e espaço todos os locais da descoberta. À chegada ao desmazelado aeroporto, uma comitiva mascarada fez-nos, muito desordeiramente, atestar com mais ou menos exactidão que não portavamos qualquer tipo de gripe suína.

Como alguns dos meus leitores bem devem saber, as praias mais a Norte da região de Goa (na zona de Baga e Calangute) ficaram conhecidas por ser verdadeiras passerelles de globetrotters hippies da geração de 60, com sessentas, que se aproveitaram do caos pós-independência para ocupar muitos daqueles espaços (ainda vimos alguns bem “comidinhos”, entoando um Inglês arrastado e pouco recorrente). As raves, rodas e neons acontecem mais na época alta e, felizmente, não as experienciamos, como temia que pudesse acontecer.
Só não compra droga quem não quer e/ou não gosta. Todo o tipo.



Pangim (ou Panaji), a capital, merece visita atenta (assim como as vizinhas praias de Dona Paula e Miramar), situando-se centralmente na geografia da região, dividindo a confusão do Norte e a calmia ao Sul.
Qualquer coisa na dimensão de Leiria mas sem o estádio e o castelo. É muito portuguesa em tudo. Os grandes edifícios ainda utilizados pelas administrações locais são os mais imponentes e o espelho da arquitectura colonial do Estado Novo (cores, jardins e palmeiras).
Depois o ferry que nos liga ao Forte de Aguada é experiência mais que aconselhável. Aqui percebeu, imediatamente, Vasco da Gama onde escolheu acabar os seus dias, conquistado que estava o meu agora vizinho e estratégico Estreito de Ormuz, na fronteira marítima entre o Pérsico e o Índico.


O Sul de Goa é paradisíaco, selvagem e genuino. Menos português talvez.


Ficou uma parte bastante importante por conhecer. As regiões mais interiores do território que se distanciam do conhecimento geral. A selva, no fundo.

Esta foi a melhor viagem de toda a minha vida, uma polpa de cultura, história, natureza, cor, aromas e partilha. Quero mesmo sublinhar a palavra partilha.

Mas muito honestamente (talvez ao jeito do incatalogável Prof. José Hermano Saraiva a encerrar mais um Horizontes da Memória) sinto uma aflição inexplicável ao perceber, bem ao jeito da péssima gestão patrimonial que caracteriza Portugal na transversal, que o ensino do Português não seja fomentado, que não se tome providências em jeito de concertação política para que o ainda palpável legado não caia de vez.
É uma aflição mesmo.
Bastarão duas gerações para que tudo se esfumasse em fogo animado de vento forte.

A universalização do Inglês – estes ingleses sim, geniais gestores – sente-se (e bem) por aqui . Conhecendo, claro está, toda a história victoriana da região.
Temos como sempre, as maiores responsabilidades, pelo abandono cultural a que votamos estes territórios-irmãos mas clamamos, como sempre, a partir do conforto de nossos aposentos aveludados, que ninguém faz nada.

Recomendo, para trabalho de casa, A Causa da Decadência dos Povos Peninsulares nos Últimos Três Séculos por Antero de Quental.
Explica, de forma glaciar porque em Portugal se canta o fado, porque é que Dom Sebastião tarda em aparecer e porque não se avizinha baixa do nevoeiro.
É ensaio de uma actualidade e intemporalidade cortantes, passado que está mais de século e meio desde sua escrita.

Goa é mais que recomendável.
Goa é compulsória.

Para consultar o registo fotográfico mais completo: http://www.facebook.com/photo.php?pid=1887439&id=799922242#/album.php?aid=85182&id=799922242




quinta-feira, 7 de maio de 2009

Many people believe that Dubai is a futuristic paradise or a late-capitalist nightmare...

Poderá ser, por causa do calor húmido que já se faz sentir no Dubai-Primavera, o que é certo é que não tenho andado a fazer os trabalhos de casa.
E quem não faz os trabalhos de casa, mesmo que seja iluminado e tire vários "Satisfaz Muito Bem" (com letras maiúsculas), não tem nunca o "5" no final do período.
Nada se faz sem trabalho.

Assim sendo, é altura de me redimir porque ainda tenho tempo de fazer chegar à Senhora Professora uma redacção que substituirá quase todo um período de faltas de trabalho de casa.
Englobará as disciplinas de Meio-Físico e Social, Estudos Sociais, Geografia (Social), Português A e B, Sociologia e se, os Senhor Professores de Filosofia e de História assim o entenderem, essas duas disciplinas mais.
Um trabalho das Humanidades, portanto
Passo a transcrevê-lo:

"
Somos tentados a acreditar que estamos num país desenvolvido tal a quantidade (e qualidade) de bens móveis e imóveis que nos rodeiam.
As ruas estão limpas, de cara lavada, não há rigorosamente criminalidade nenhuma e eis que, subitamente, os mais distraídos apercebem-se.

Apecebem-se que poderão estar num país quase-desenvolvido quando se começam a deslocar ao centro, em Deira, e já reparam mais suor nas faces, cestos de especiarias no solo, olhares plácidos e carentes, sorrisos sinceros dos miúdos, bolas de futebol a rolar, indigência disfarçada em quartos de 5 pessoas.



Voltam à Jumeirah Beach Residence e voltam a descrer e a crer.

Hora de aglomerado de "indianos" (palavra usada por ocidentais para descrever cidadãos da Índia, Paquistão, Sirilanca e Bangladeche) que saem de mais uma obra e que adormecem a fazer fila para o autocarro que lhes vai levar o corpo a descansar algumas horas.
Descrê-se que se está num país quase-desenvolvido para se finalmente crer que se está, num país em vias de desenvolvimento.

Os Emirados são um país em vias de desenvolvimento porque sabem que lhes falta muita coisa e não têm cultura de a ter.
Como qualquer remate de Leonel Messi, assim fácil, potente e de belo efeito, quem não pode fazer o que quer, compra.
Compra-se o know-how à Europa Ocidental, EUA, Oceânia e África do Sul e a mão-de-obra, à Ásia Oriental.
Só assim se compreende que, por mais passivo que se possa ser em relação à vida, um europeu possa ficar cá.

Ficar por menos de 5000 Euros mês "não vale a pena" segundo muitos expatriados ocidentais.
"Ainda me podem vir a pagar o automóvel e o alojamento".
Quando se lhes pergunta se estão a gostar, encolhem os ombros e esgalham um sonoro "umpf".
"Fui escolhido sem entrevista, tenho o curso de Engenharia Civil e eles estão com muita pressa de acabar o projecto. Só indagaram acerca da minha ocidentalidade e se 5000/mês estava bem. Foram dois e-mails e olha, estou cá há 3 anos".
Mas estás a gostar? "Umpf".

O Madu, nosso carinhoso indiano office-boy, que já tira cafés quase Delta, vai-nos falando de alguns primos que vieram para cá.
"Prometeram-lhes casa com quarto e um bom ordenado. Mas vivem nos compounds na zona do deserto de Jebel Ali. Tomam banho quando calha e trabalham 12 ou 13 horas por dia. Agora não se importam. Mas em Julho é que vai ser porque vão estar 50 graus. Podem morrer, podem mesmo morrer."
E o Madu tem razão. Há centenas largas de mortos por "acidente de trabalho" que é a forma eufemisticamente utilizada para substituir "exploração" ou "escravatura humana".

Se se lhes pergunta: "então estás a gostar?" hesitam muito menos que aqueles portugueses ocidentais - "Não. Mas a minha mãe precisa do dinheiro e tenho que o enviar".
Resposta semelhante ouvir-se-á garantidamente das centenas de prostitutas que se passeiam pelas ruas do Bur Dubai de países tão distintos como a Ucrânia, Casaquistão, Mongólia, China, Eritreia, Quénia, Nigéria, Filipinas ou Bangladeche.

Porque sou um tipo que sempre gostou de conversar com taxistas (porque sabem sempre os resultados da jornada e os spots mais "quentes" da cidade) foi-me comunicado que após 12 horas de trabalho "a vontade que tenho é de me despedir. Mas não posso porque no contrato está que tenho que pagar uma taxa de despedimento. Ganho mal e não gosto do que faço mas o meu irmão tem uma gangrena e não deve durar muito mais".

Subitamente pega violentamente (soltando as mãos do volante) na farda oficial de taxista. "Estás a ver isto? Isto é merda! Conheci uma mulher de negócios, marroquina, fomos à discoteca do Atlantis Hotel. Ela é linda, foi uma noite maravilhosa. Na semana seguinte, voltei lá para deixá-la e o mesmo porteiro, meu conterrâneo, que quase me tinha feito a vénia ao entrar, escurraçou-me, em indiano, a bater compulsivamente no capot do carro, dizendo que ali não era sítio para se parar. Voltando a pegar na farda e com um safanão no volante, This is shit Sir, I don ´t have studies. This is shit".

Ainda mais me confrange saber que as castas sociais na Índia são ainda lâminas aguçadas e apontadas à inteligência e razoabilidade humana.
Os indianos mal-tratam-se entre si porque nasceram em regiões diferentes. Aqui ainda se inflacciona mais esse estado de coisas latente. Se estão fora, competem e competem ao ponto de se humilharem com reverências bacocas aos ocidentais, que são pré-requisito de formação para qualquer biscate profissional. Os árabes exigem, em períodos de formação curtíssimos, ou melhor, formatação, que se use o "Sir" ou o "Boss" sempre em relação aos ocidentais.
Não interessa a formação profissional. Interessa a formatação social.

Depois (e sabendo que é sempre injusto generalizar mas é tão flagrante que dói), à semelhança das Ouras e Montechoros algarvios, vemos britânicos a escarrar para taxis só porque já estão cheios de gente e não vão parar.
Britânicos que são pagos pelos árabes que "formam" os indianos.

É o que acontece quando está muito calor para trabalhar, há muito dinheiro, pouca inteligência e pouco saber-fazer.
Importa-se frescura física, cabeças pensantes e técnicos especializados.
O deserto transforma-se e a obra nasce.

Nem tudo são espinhos.
O Dubai tem autóctones muito preocupados com a situação.
Gosto de me deslocar ao "Shelter" que é uma Associação Cultural. Como o nome indicia, um dos únicos abrigos de nicho.

The Shelter

Conheci dos árabes mais interessantes e imparciais de toda a minha vida. Bebemos vários sumos naturais (são baratíssimos e poderosos), conversamos e pegamos em um ou outro filme para ver.
Depois, no fim-de-semana, vou até às maravilhosas "wind towers" e calcorreio as vielas por onde se escondem fantásticos cafés em páteos interiores e se descobrem algumas galerias de arte.
Palpita-se o melhor da Europa (com europeus e restantes ocidentais), com gente interessada, com gente interessante e acima de tudo, com gente criativa e colorida.


Catherine David, francesa ao serviço da arte, curadora e historiadora que deu o mote para o título deste blog acaba assim:
"We are trying to show that the situation is more open, more complex, more heterogenous."
Espero, do fundo do coração, que a presença destas pessoas com quem bebi sumos, seja um sucesso, lá na Bienal de Veneza.
Porque há cruzes que pesam muito mais que outras.


Mas não se preocupem, senhores dos poços, que estes não são perigosos.
Não se preocupem.
Apenas pintam.
Xiuuuu "

A smile so far removed, one day will be improved...


Espero que a Senhora Professora tenha em atenção as despesas que tive, o grau de cansaço da grandiosa viagem e a ausência de refeições quentes durante a mesma.
Peço o "5".

Sobre a exploração humana no Dubai vale a pena espreitar: http://www.youtube.com/watch?v=1G--pYzttkY&feature=fvst e
http://www.youtube.com/watch?v=gjqlbVuTtEA

O grandioso Shelter: http://www.shelter.ae/

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Pode pôr mais 300 gramas! Mas não corte fininho. Nunca corte fininho.

"O João?
Ainda está no Dubai!
Vai ao blogue..."
Após "longa travessia no deserto" (finalmente - e após tantos anos - encaixo esta expressão na sua plenitude) e um arrastado período de modorra física e emocional, volto a acreditar que tenho ainda algumas faculdades para soltar uma ou outra palavra neste "Do And Buy" que, já sabem, muito vos estima.

Estou a 3 dias de completar metade do meu casamento (que expira em Julho) com o Dubai, com os Emirados (todos) Unidos e com este blog.
Costuma dizer-se que após 3 meses, 3 anos ou 3 décadas (e por aí em diante) algo acontece - não se sabe é bem o quê.

Como eu sou de direito, compete a quem de direito, mostrar a quantas andam estes senhores, o que fazem, o que não deixam fazer, o que mostram e o que pretendem ver mostrado.

Uma presença profissional de apenas seis meses noutro continente nunca poderá apagar a sensação de turista atordoado, lazer, ócio e descoberta.
Portanto, sou muito mais semi-profissional do que profissional e amador, porque amo ser semi-profissional.

Apresento-vos um rol (ls Royce) de algumas situações que, se assim o entenderem, poderão aproveitar (de forma muito mais séria e profissional) para os vossos desenvolvimentos científicos e/ou académicos.

Serão case studies os:
A Limu ou a limousine

Quem nunca cobiçou a possibilidade de participar no saudoso "Parabéns", sendo largado à porta daquele teatro, na Limu do Herman José?

O Dubai não tem tempo para brincadeiras de praceta.
Por isso é que não há putos a jogar à bola no exterior, na impossibilidade de fazer balizas à medida do tamanho dos garotos.
É então um facto que, no Dubai, não há pracetas. Nem se lhes consegue explicar o seu significado.
Nem há praças porque ninguém faria uso delas. Há rotundas que têm espaço de praças.
São rotundas porque no Dubai ninguém anda a pé.
E ninguém gostaria de ver uma praça sem gente. Ou uma rotunda feita praça.

Há estradas, alamedas, avenidas, ruas-estradas e palmeiras em todas elas.
As estradas são normalmente auto-estradas, as alamedas são apalmeiradas, as avenidas um misto das duas e as ruas-estradas, muito bem pavimentadas.
Aqui estão dispostos os motivo para a existência da Limu.


A Limu em Portugal nunca pode funcionar: a não ser em Azeitão, na rampa-limu que o Herman mandou construir com a tecnologia e o know-how importados do Dubai.
Mas cabe na cabeça de alguém subir de Limu para a Sé Velha em Coimbra, descer às vielas da Ribeira no Porto ou perder-se na Alfama de Lisboa?

Tenham juizo!

O Camelo


Existem duas espécies de camelos: o dromedário ou camelo árabe, que tem uma só bossa, e o bactriano, mais comum na Ásia Central, que possui duas.
Portanto, o dromedário também é camelo.

Os camelos, por serem animais indulgentes, ultra-resistentes ao calor, com capacidades sobre-camelárias de armanezamento de água, serviram tradicionalmente para o transporte de populações nómadas beduínas, juntamente aos seus haveres.

Mais tarde, os menos nómadas e mais sociais, acabaram por se fixar em algumas das zonas costeiras do deserto, começando a criar povoados piscatórios, como é o caso do nosso Dubai.

O Dubai era uma aldeia há cerca de meio-século.
É inacreditável acreditar que alguém acreditou que, acreditem, o Dubai pudesse ser acreditado mundialmente como potência económica e financeira.
Petróleo.

Os camelos, já num plano lúdico, servem de instrumento às ásperas apostas nas corridas.
As TV´s e jornais locais não passam um dia sem referenciar as lesões dos players, as possibilidades, as características e claro, as próprias corridas.

Pusessem muitos jogadores da bola os olhos nestes camelos que correm a mais de 40 graus e teriamos aí jogadores com eles no sítio, para encarar o futuro dos nossos clubes de outra maneira.
É muito simples: treinas a 100, jogas a 1000!

O camelo serve ainda para o turista-de-praia tirar uma foto, após 15 tentativas goradas de subir para cima do belíssimo mamífero.
Completamente ensebado de suor, sorri, é fotografado e a foto, imediatamente digitalizada, está pronta a ser enviada para Bochum na Alemanha, onde o cunhado e a sobrinha mais nova residem.


As natas do Céu

"Dinner in the sky"


"É pa, onde é que se come bem e barato?"
Esqueçam.

Ou comes barato e mal (à excepção de locais que, por princípio, só divulgo a quem mostrar merecer) ou comes caro e benzinho.

Ou então comes no céu e logo me dizes.

Querem que me acredite que é espectacular elevar-me à altura de 7 andares (com cozinheiro incluido) para que tenha um repasto inesquecível...
E se o vinho acabar?
E se estiver com diarreias?
Patrocinam penico?
Fraldinha?

Não há nada como uma mesa como bancos corridos, pés bem assentes no chão e palitos para quem não quiser guardar a "febra" no dente, para a primeira refeição do dia seguinte.

Mas o que vale é que só a nata sobe ao céu.
E a nata não deve gostar de vinho de mesa corrida nem de fazer cócó.


A menina não cobiça o menino (ai dela!)


Apesar de assumir o tal papel de playground do mundo islâmico, o Dubai pauta-se inevitavelmente pela Sharia (Lei Islâmica).

O menino que pretende galar a menina, não o deve fazer neste parque.
Vai jogar berlindes para o lado oposto, ou então, espera pela noite e procura o melhor hotel, com o melhor piano-bar que alberga a melhor banda residente de covers dos Dire Straits do mundo, trocando os berlindes por notas de conto-de-rei que tudo vão pagar.

Incrível, incrível é perceber as meninas, completamente cobertas, algumas com máscaras de ferro devidamente ornamentadas, apenas com espaço para os olhos verem o que lhes é permitido.
Consta que, por baixo da túnica encomendada a estilista de renome, está a roupa adquirida num dos muitos Ovos Malls, perfeitamente urbana.
Os acessórios, esses, são do mais ocidental possível.

Quanto a eles, passeiam-se em JBR numa passerelle automóvel que engloba tudo o que possam imaginar (Bentleys, Lamborghinis, Porsches, Maseratis, Rolls Royces, Jaguars, Mustangs, Cadillacs, Hummers e os inevitáveis Ferraris - alguém se recorda dos Mercedes, Volvos, BMW´s ou Audis?).
Envergam sandálias, túnica branca sem um único vinco. Impecáveis.

Agora, esqueçam-se.
Ficam mais que sugestionados para uma prova de doçaria regional de fim-de-semana.
Doce de li(mouss)ine, baba de camelo, natas do céu e ovos malls.

Olhó Dubai!
É p´ró menino, é p ´rá menina...

(Um bem-haja muito grande aos simpatiquíssimos Miguel e Carolina que, de visita, me emprestaram as fotos para este post)

quinta-feira, 2 de abril de 2009

O Eixo Oiã - Omã

A tempestade de areia.
Da mesma maneira que fica sempre bem dizer que se esteve em casa do Paulo Bragança, afiançando que ele anda sempre calçado na intimidade do seu lar, dizer que se esteve na "Arábia" e que foi óptimo apanhar com uma jarda de areia quente-molhada, é ainda melhor.
Registar fotograficamente este acontecimento metereológico para memória futura, é já um clássico para um não-nativo que deambule por estas bandas.
Como nós somos pouco clássicos e muito puritanos, não temos fotos desse poderio da Natureza, recomendando vivamente a presencialidade.

Devem levar, pois, sem aparelhos fotográficos, a maior quantidade de areia que suportarem nos canais respiratórios.
Guardem a areia num frasco, tal qual saiu do nariz e boca.
Quanto não valerão esses frasquinhos em Portugal?
Pois é, também estamos cá para os conselhos...
Mas prossiguemos.
Como também somos pessoas muito lúcidas e razoáveis, embarcámos, para fugir da tempestade emir, na nossa primeira internacionalização da intercontinentalização que estamos a viver.
Passámos a fronteira para Omã.

Meus caros, vale muito a pena.
E sim, finalmente pudemos perceber um pouco da realidade do deserto nesta viagem de 5 horas que, com a banda sonora indicada, se pode tornar um colossal hino à existência humana.

Do Golfo Pérsico rumamos às águas um pouco (mas muito pouco) menos calmas do Golfo de Omã.

Omã é Sultanato, que como o nome indica, é a terra e propriedade de Sua Majestade Qaboos bin Said Al Said, Sultão de Omã.
Esta viagem, ainda se torna mais especial, para o portuguesito emocionado que busca desesperadamente consolo d´alma por uma razão muito importante: em 1508 "dominámo-los".

Este aconchego emocional provocado pelas viagens do passado, acompanha-nos sempre naquelas que fazemos no presente.
E os portugueses arrepiam-se muitas vezes quando se apercebem do legado (e herança!) que, em muitos locais, é ainda mais respeitado do que entre-muros.

Olhem, eu arrepiei-me.

A Portuguese Fort - beginning of the XVI century - one of the most well conserved in the world

Pelo que me apercebi, Omã (Oh Man, para os que usam o Inglês) é muito mais genuino e rico em história palpável do que os Emirados Árabes Unidos, país recém-formado, apenas em 1971.

Os Emirados denotam também, uma muito mais forte presença colonial britânica, ainda hoje patente em muito do trato social vincadamente mercantilista.

Há menos para fazer.
Há mais para ver.

Musqat, a capital, é uma cidade encaixada numa das morfologias mais bizarras que alguma vez presenciei.
Um misto de ruga marciana com algum deserto lunar, em tons laranja-castanho.

As casas, algumas mais próximas das arribas, estão literalmente encrostadas e confundem-se com a cor da paisagem.

O mesmo se aplica às pequenas póvoas que iam despontando por entre a viagem feita de cabras e campos de futebol muito pelados onde os putos,com camisolas contra-feitas de grandes clubes europeus, vão jogando o seu futebol-descalço.



Era dia de jogo e soubemos que Omã saiu vitorioso do encontro para a qualificação do Mundial de 2010 a acontecer na África do Sul. 2-0 sobre a sua congénere do Senegal, em Musqat.

Para sublinhar esta genuinidade, lembrei-me de Oiã.
Primeiro porque rima com Omã.
Depois, porque é a porta de entrada na Bairrada, para quem vem de Norte e a de saída, no sentido oposto.
E o Leitão genuino, é o da Bairrada.

Neste momento assa-se o melhor leitão precisamente em Oiã (para além do Vidal, que assa muitíssimo bem, em Aguada de Cima).

A Mealhada, com o seu firework de restaurantes plantados em cima da antiga estrada nacional, é uma farsa que se paga, ainda por cima, muito caro.
É publicitada entusiasticamente por quem tem uma consulta no médico em Coimbra ou vai levar mensalmente a roupa lavada ao filho, que também estuda na Lusa Atenas e está em época de exames.
Isto tudo só porque, definitivamente, coloco o Dubai quase no mesmo plano da Mealhada.
Só não está lá exactamente, porque não tem o Carnaval.

E como bem sabem, o Carnaval faz falta.

Oiã é Omã.
Chapado.

Empreendo neste momento, o processo de mediação para a geminação daquelas quatro localidades (Oiã-Omã e Mealhada-Dubai), de acordo com o entendimento supra-citado.
Nas entrelinhas, a proposta da ecumenização do suíno.
Dar a perceber, por estas ruas, porque é que um Leitão bem assado é tudo menos profano para um cristão, que pode e deve poder adquiri-lo em mais que uma secção de talho por cidade.

Faltará apenas nomear Sua Majestade....................................................Leitão, Sultão de Oiã.

Perspectiva panorâmica de Oiã: ao anoitecer

terça-feira, 24 de março de 2009

Diz que faz hoje dois meses...

E se, de repente, nascessem?
A saber que a "vida" estava confinada (qual karma...) a 6 meses?
Como a celebrariam?

São 6, os festejos que vamos ter que cumprir por cá (fora aqueles outros para os quais ainda vamos ser convidados por pessoas extraordinárias que nos acenarão, dizendo saber que em Portugal se fala Castelhano).
Celebramos (vocês também comigo) os 2 meses, meus caros...
Os dois meses mais caros.
No Sábado, dia 24 de Janeiro de 2009, quando se começava a desenhar a 18ª jornada da 3.ª Divisão, Série F, com esse enorme Barreirense-Campinense (ver infra ficha de jogo), eu próprio, João Maia Dias e Tiago Soares aterravam no Dubai, naquele dia que se perfigura como o único em que choviscou até ao momento.
Ficha do jogo:
Estádio: António Almeida Correia (FONI), em Alcochete
Tempo: Tarde de verão
Terreno de jogo: Bem tratado
Árbitro: Tiago Martins (Lisboa)
Árbitros auxiliares: Hugo Proença e Nuno Duque

Enquanto que aquele Barreirense-Campinense se saldou num empate (revelando que a equipa do Barreiro, comandada por Carlos Fernandes ainda não mostra as credenciais que lhe foram atribuidas no início da época e evidenciando necessidade de amadurecimento nos processos de transição defensiva), no Dubai celebrava-se a vitória da chegada.

E como celebração rima com "ponto da situação", tomei a liberdade de vos voltar a prender ao Dubai, nem que seja tropeçando, mais uma vez, no meu blog.

Para além da simpatiquíssima visita da "Grande Reportagem" da SIC, nas pessoas de Miriam Alves e Jorge Pelicano, (responsáveis, respectivamente, pelos excelentes e premiados internacionalmente trabalhos “O Balneário” e "Ainda há pastores?", nada de muito diferente aconteceu por terras do Sheikh Al Maktoum.

Em relação àquela "Grande Reportagem", a rodar previsivelmente em final de Abril, vos adiantarei mais pormenores em breve.

Surpresas a nível de rostos conhecidos, em prime time.
Valerá a pena, no conforto das vossas chaises longues ou canapés, sem ter de ligar o PC...
Há que ser paciente.

Se ainda alguém vê a MTV (para além daquele grande clássico que nos introduziu a muitas das bandas que ainda ouvimos hoje - Alternative Nation) e se lembra das festas de praia com jacuzzis a 20 metros da areia, barbies danceteiras, Moët & Chandon e muito Saint-Germain a sair do Sound System, vai querer dissecar estas fotos.

Suspended Matrasses: Sunbaths & Mojitos from England, France, South Africa, Cape Green, Ciprus and Portugal

João Dias - chill out time

João Dias and Tiago Soares: The gorgeous portuguese men

Nestas festas, meus amigos, só por convite.
E este é o Dubai dos clichés, aquele de que todos falam na Europa.
Aquele Dubai exclusivo. O das 7 estrelas (a caminho das 9).
E para isto, meus caros, é preciso conhecer pessoas importantes.
Nós, não facilitámos.

Por entre dias de trabalho entediantemente iguais, percorrendo a Sheikh Zayed Road até Greens no regresso a casa e o inverso na ida para a labuta, lá fomos espreitando alguns spots obrigatórios.

Com a devida distância, assim como não se pode ir a Florença sem se entrar no Duomo, não se pode sair do Dubai sem contemplar o Burj Al Arab, o Burj Dubai, the Palm, Atlantis Hotel ou a plêiade de Ovos Malls que se instalam tal como no SimCity, com apenas um clic.
Aqui estão dois dos ex-libris:

Burj Al Arab. View from Souk Madinat Jumeirah: the only 7 star hotel in the world

Burj Dubai. The world tallest building

Para além disso, temos entusiasticamente experimentado a água do Golfo que já não chega para nos arrefecer dos pouco primaveris 37 graus (mas afinal, em que Estação do Ano estamos nós?).

Como em todo resto da cidade, o lazer das "castas sociais" espartilha-se por zonas distintas.

Se o centro, em Deira e Bur Dubai é povoado por shoppings semi-desertos à semana (tal como aquele Riaplano ou Oita em Aveiro, o Avenida em Coimbra ou o Dallas e Brasília no Porto, que fervilhavam nos oitentas, mas agora deglutidos e tornados tubos de ensaio para muitas das bandas-locais-prestes-a-explodir), enchem-se ao fim-de-semana de indianos, paquistaneses e filipinos.

Assim como as praias menos fashion onde, vestidos e de dedos entrelaçados em sinal de Amizade, se passeiam indianos-homens (as suas mulheres aguardam na Índia o seu regresso, estimado em 5 anos e vão "levantando" o dinheiro que vai chegando irregularmente, por correio, em mão de meirinho) no único dia de descanso semanal - o Sábado.

No Dubai "novo", na praia dianteira à Jumeirah Beach Residence, aglomeram-se os expatriados (mas quem foi inventar e implemetar tal palavrinha - a lembrar uma qualquer Sibéria estalinista) ocidentais, sendo facilmente perceptível descortinar uma palete linguística e de sotaques que vai do Inglês da Austrália ao dos States, do Português europeu ao Português da América do Sul, Italiano, Polaco, Alemão, Basco e, quiça até, escorregar numa qualquer leitura do Asterix em Mirandês.

Na parte traseira das imponentes torres da JBR, os enormíssimos rococós dos Ovos Malls e as compras de fim-de-semana numa qualquer Ana Sousa ou Sacoor Bros...

A partir deste momento relanço o meu blog.
Torno-o massificado e pisco o olho ao Sheikh.
Por outro lado, corro o risco de ser linxado por parte da crítica.

A lembrar os Stone Roses, na ponte entre o intemporal álbum homónimo e o muito Dubaiano, pindérico e pretencioso Second Coming de 94.
O que vale é que, por aqui, poucos criticam e quase ninguém conhece o Ian Brown.
Por baixo desta máscara estará sempre, vos juro, o menos alienado e responsável John Squire.

A partir de hoje, este blog nunca mais será o mesmo.

If you want to set up a business in Dubai: take off your shoes and dance the blues.

terça-feira, 10 de março de 2009

No Golfo, também sopra a brisa fresca...


Vocês, meus estimados amigos, a razão de ser do meu parco mas esforçado blog e todos aqueles que, amantes do Árabe, planaram até ao título deste moleskine, merecem tudo.

Depreendo também que muitos de vocês se perguntarão como será possível que "aquele gajo que está no Dubai e nós aqui no nosso Portugalzinho", 80 % do que escreve é lamento, pesar, desconforto e introspecção inflaccionada.

Se 50% daqueles 80 (30% são delírios do leitor, genialmente induzidos por mim) são possivelmente verdade, ainda nos restam outros 50%.

Estejam descansados, meus estimados, que isso significa que "aquele gajo que está no Dubai" não denota traços depressivos nem uma tendenciosa e parcial aptência para a Sociologia de Bolso.

É então, dos outros 50 por cento que vos quero falar.

O Dubai tem que ser encarado com sentido de humor.
O que me pareceu trágico, afigura-se-me agora como cómico.

E é verdade que há muita coisa aqui que não acontece em nenhum local do Universo, quanto mais nos brandos costumes de Portugal.

Meus caros, refiro-me ao denominador comum por cá: a Exuberância!
As Peitudas dos Automóveis - Alguém se lembra desta película de 1987 com o título original em Eslovaco Kozy Vozy?

Contam-se pelos dedos de um pé, quantas vezes por dia, em Portugal, se apanha um murro da Exuberância (quanto muito da extravagância...).

A Exuberância exige dinheiro. E Portugal é pobre.
A Exuberância clama por dimensão. E Portugal é pequeno.
A Exuberância brada às dinastias. E Portugal é uma Democracia.

Portugal já foi rico, grande e dinástico.
Mas já não é.
Já não é Exuberante.

Acontece que o meu querido homónimo, de seu apelido Gouveia, durante um cafezinho de portugueses (tem que ser para se chorar em conjunto uma vez por semana!) com a sua mui amável esposa, Dona Carina, trabalha no Dubai Autodrome.

Já em jeito de despedida:
"É pa...tenho aqui algumas credenciais. Vai haver uma corrida das Speedcar Series. Passem por lá...".
"Obrigado João...Dá cumprimentos lá em casa".

Programa de Sábado à tarde (que correspondia ao nosso imaculado Domingo de futebol português - agora joga tudo à noite, em dias de trabalho e não deixam entrar tremoços...), "romeira-se" ao Autódromo, às corridas de cavalo, aos jogos de cricket e ainda, se formos mais fundo, às impressionantes corridas de camelo (sim, estes animais não saltam barreiras mas correm...).
Entrei, a recordar-me das intermináveis sessões de Fórmula 1 do pós-almoço domingueiro no Canal 1.
Ali estavam as meninas peitudas por todos os lados, boxes abertas, em exposição de um lado, Lamborghinis Gallardos, Maseratis ali, Ferraris acolá e, ao fundo, o acesso à pole position, antes da partida.

"Ó Tiago...aquele gajo ali parece-me o Jean Alesi."
"É verdade Sardo. Mas olha que ali só pode ser o Johnny Herbert".
E era.

Sir Johnny Herbert, a Trail of Dead Fan, with the Portuguese Commission

Aqui está grande parte daqueles 50%.

Como daquela vez que vimos no Dubai (Ovo) Mall (o maior do mundo!) Rivaldo a cruzar-se com o estilista português João Rolo, denotando total desconhecimento um pelo outro...

Caríssimos, tudo isto é Exuberante.
Tudo isto é cómico!

Mais oui, c´est Jean Alesi!

quarta-feira, 4 de março de 2009

Sobre algumas considerações sociais e o Casamento.


Já aqui tinha feito, muito na diagonal, uma ou outra referência às castas sociais não institucionalizadas que perspassam na vertical todo este folclore que são os Emirados Árabes Unidos.

Mas, uma acepção mais linear de "folclore" (aquela que habitualmente a populaça apelida também como rancho), pode deixar adivinhar uma noção negativa associada a preconceitos que se prendem com diferentes percepções culturais.
Ou por outro lado, a consideração de que tudo o que é folclore é, ora parolo ora foleiro.
E é injusto que assim seja.

Se espreitarmos o website da Federação do Folclore Português (geralmente confundida com a inexistente Federação Portuguesa de Folclore - pelas óbvias referências futebolísticas) sabemos que o Grupo Folclórico e Etnográfico de Macinhata do Vouga foi assaltado:


"A sede do Grupo Folclórico e Etnográfico de Macinhata do Vouga (Águeda), foi assaltada e o seu espólio material e cultural roubado. O fruto de mais de 20 anos de trabalho desapareceram e o futuro desta colectividade ficou seriamente comprometido, seja pelas perdas insubstituíveis, seja pelo desalento que tomou os dirigentes e os componentes do Etnográfico de Macinhata do Vouga".

Alguém, de bom senso, discordará que se ateste a gravidade do ocorrido no que toca ao (des)respeito para com as raízes ancestrais (agora arrancadas) da Freguesia de Macinhata do Vouga? E aqueloutras para o Concelho de Águeda?
Em continuação:

"Qual a motivação? Qual o interesse económico dos larápios? Qual o destino de tanto património cultural roubado?"

É com esta questão etno-cultural poderosíssima que temos que, inevitavelmante, assumir uma reflexão consciente.



Apesar de me considerar muito pouco burguês, a verdade é que, em muitas áreas da vida, padeço de um certo aburguesamento que se prende com caprichos, selectividade e triagem qualitativa.

Isto porque, se em vez de me falarem de "folclore", me sussurrarem ao ouvido World Music (em Português, Música do Mundo ou as Músicas do Mundo) penso logo em Sines ou no Sons em Trânsito.
E isso sim. Isso é de Salas 2 a horas pouco convidativas, lá para os lados do Oita, na Lourenço Peixinho.

A mesma história, a da música popular e a da música pop.
Não serão elas a mesma e uma só coisa mas dita por pessoas diferentes e em ambientes distintos? Ou pelo menos, concordaremos, não terão, pelo menos, uma base claramente comum?

Com esta verborreia toda, já se esqueceram do GFEMV (Grupo Folclórico e Etnográfico de Macinhata do Vouga)?
Pois eu, não.

Pretendo fazer um pequeno exercício, baseado ainda na minha profunda inexperiência de vida (por isso vos peço a vossa preciosa crítica, compreensão e auxílio para que se complete atempadamente esta tese).

Quero encontrar os larápios, aqui mesmo, nos Emirados.

Deste modo, restituir a dignidade aquela Associação Cultural sem escopo lucrativo que, de forma tão militante, leva a Macinhata aos cinco cantos da emigração portuguesa (porque ainda não há voos comerciais para o ciber-espaço).
Viva a Sociedade Civil!



World Music Vs Folclore / Sines Vs Encontro Nacional de Folclore de Águas Santas


Por admitir ser mais aburguesadito, tendo em acreditar que este ano, à semelhança dos anteriores, o Encontro Nacional de Folclore de Águas Santas vai ser uma parolada.
Seguramente, as Músicas do Mundo em Sines, ou o AnDanças em São Pedro do Sul, mais uma vez respirarão a qualidade que sempre os caracterizou, na prazenteira possibilidade de mergulhar respectivamente, ora no Oceano Atlântico, ora no Rio Vouga.

Assim é por cá, quando os playmobis da construção vindos do Paquistão, Índia ou Filipinas, "despegam" em magotes fazendo jús à tal expressão que todos aprendemos na cresce: "de mãos dadas e em filinha indiana".

Cheiram muito mal, sorriem porque têm que ser simpáticos, escutam e dançam música muito pouco árabe.




Dirão, a maioria dos expatriados ocidentais, que não entendem como estes monhés se comportam daquela forma. E dirigem-se eles depois para Sines, no conforto do seu automóvel patrocinado por uma das três maiores empresas do ramo.



No dia seguinte, são os primeiros a telefonar para os filhos na Europa a referir que, depois de Sines, ainda tiveram tempo para ver uma das maiores companhias de dança do ventre de Oman que, por acaso passou em Abu Dhabi para o aniversário do Sheik e que, "afinal vai começando a aparecer alguma oferta cultural por cá".



Por mim, vou chegando a algumas conclusões, num país em que apenas 34% da população é autóctone (e 10% no Emirado do Dubai), sendo que a grande fatia é proveniente de outras regiões asiáticas e, residualmente, ocidentais que trabalham como técnicos superiores, directores e administradores.

E sim, foram estes ocidentais, a par dos árabes envaidecidos que os gostam de ouvir falar, que introduziram a falsa World Music (a mesma, a da Mariza que canta o "fado" e que povoa as televisões locais) e ridicularizaram o folclore que, ao contrário de nas outras partes do mundo, chega de fora, lá dos lados das Índias e Filipinas.
Quer-se queira, quer se não queira, quem constrói a identidade cultural é quem está. E que está em maioria sulca mais fundo.



E isso é folclore.
E isso é ser popular.

Isto não é rancho.
Portanto, aqui deixo, para memória futura, algumas fotos do melhor momento desta minha estadia.

Tive o privilégio e a honra de aceder ao convite simpático e assistir ao casamento da irmã do "nosso" Sunil (casado com uma chinesa que conheceu em Inglaterra enquanto tirava o seu MBA), administrativo lá no escritório.
Nascido no Dubai, de origem indiana, fruto da angariação árabe de mão-de-obra, iniciada nos sessentas aquando da descoberta efectiva de petróleo, elemento que continua a pagar as exuberâncias que nutrem o ócio dos autóctones.
Nasceu cá mas nunca obteve, nem obterá, a Nacionaliade.

A cerimónia realizou-se no único templo indiano que, numa atitude muito pouco ecuménica e a muito custo, sobrevive num armazém do Bur Dubai, encafuado na indian lane souq, na parte mais antiga (mas pouco) da cidade.

É deste folclore que falo.

E num país de nómadas, sem recursos naturais a não ser o fabrico de petróleo (descoberto há um par ou mais de décadas), com regras de sociabilidade pouco consensuais à luz dos nossos valores ocidentais, não se deve poder admitir uma ditadura de (falta de) gosto(s) e de gritante negligência etnogáfica.

O Sheik manda chamar o indivíduo, a obra faz-se. Ordena descartar e contempla. Preocupa-se, de seguida, por não estar seguro da existência de algo maior em NY ou no Parque das Nações.

Os Árabes milionários mas também aqueloutros apenas ricos, regra geral, são vaidosos, avassaladoramente pindéricos, arrogantes, hipócritas e exploradores.
Compram os serviços aos ocidentais e a mão-de-obra aos asiáticos.
Apenas retêm alguns dos semelhantes em postos administrativos para garantir que ninguém fuja da alçada desta ditadura de caprichos e falsas religiosidades.

O resto do mundo islâmico, particularmente a vizinha Arábia Saudita, que às Sextas continua a encher estádios no espectáculo público da morte assistida, olham bem de esguelha para todo este deboche. Apenas o toleram por motivos dinásticos, por respeito às origens dos Sheiks e das suas famílias nos Emirados e, inevitavelmente, pelas excelentes relações económicas que com eles detêm.

Mas esquecem-se que o Dubai praticamente não existia há cerca de 60 anos, que o petróleo já está a acabar e que os turistas cedo se aperceberão que isto tem muito pouco para oferecer para além dos pacotes turísticos risíveis, entediantes e reeinventados até à exaustão, acrescido do sol(o) abrasivo e insuportável.
Uma seca, portanto.

Ou "eles" se apercebem que a aculturação de mais de metade da população que ajuda a construir no deserto (e asseguro-vos, meus amigos, que construir no deserto não é fácil) é fundamental, ou "eles" deterão eternamente o estatuto de trampolim. Vem, salta mais rico e regressa à origem com a certeza de desperdício existencial.

Mas também é verdade que a Cultura leva tempo a ser edificada. Pode acontecer que este caminho se começe a calcetar agora. Mas nunca virando costas a quem está, mesmo sendo de fora. Isso é irrelevante. Que perigos pode haver? É ainda mais enriquecedor crescer na partilha (veja-se, a título de exemplo, as meninas de Cabo Verde)...

Não há incompatibilidades. Só se as inventa por decreto.

A esta hora estará Michel Giacometti, com o seu precioso legado, fruto das fabulosas recolhas feitas no âmbito do folclore e da etnografia, a dar voltas na tumba, e a pensar como estarão as pessoas da Freguesia de Macinhata do Vouga. Essas mesmas com quem ele falou.
E este senhor, asseguro-vos, não era parolo e sabia umas coisitas. E rancho, era raro comer.

Preferiria viver, concerteza, em Deira, no meio da confusão importada, do que no fabuloso, faustoso e mui algarvio aldeamento de Greens (onde resido actualmente, atestando então, o meu laivo de burguês comodista a caminho da falência).

As culturas não tem escalas de grandeza. Coabitam paralelamente na realidade mas se se casam, vos garanto, nunca mais se divorciarão. Amadurecem.

As culturas não são moralizadas. Por mais que se pense que se consegue, é falácia. Porque elas sobrevivem sempre às pessoas. O mais que pode acontecer é adaptarem-se. E isso só acontece quando se toca, se cheira, se sente, se vê e se ouve. É preciso conhece-las. E o (re)conhecimento é mútuo. Têm de ir ao encontro umas das outras.

Aqui, uma ocupa a redoma aveludada e pesada da preguiça. As outras, descomprometidas, aguardam a partilha de uma refeição com a mesa posta há já muito tempo.

Temo que a comida, já fria, não se conserve por muito mais tempo...

Cá por mim, já sei quem assaltou a Sede, lá na Macinhata.
Descobri os larápios.

Resta-me apenas, aguardar pelas vossas pistas sherlockholmianas.
Mas duvido que mude de opinião.

De qualquer forma, se souberem de mais alguma coisa, aqui fica o contacto que devem accionar:

"Apelamos à solidariedade e ao espírito de classe de toda a família de grupos de folclore e ranchos folclóricos, apelando à atenção de todos para identificar a presença de algumas destas peças, seja em feiras de velharias, seja em estabelecimentos comerciais com artigos da tradição ou, ainda, caso exista algum contacto para oferta de algum deste espólio. Os alertas deverão ser dirigidos ao móvel 93 640 89 27 (José Augusto Marques)."